Velharia liberada: Câmara aprova isenção de IPVA para carros com mais de 20 anos — e o Brasil comemora sem freio
Um alívio no bolso, um desafio nas ruas: o Brasil oficializa a aposentadoria tributária dos carros que insistem em não aposentar.
Rogério Bonato – Redação Almanaque Futuro
Em Brasília, a Câmara dos Deputados decidiu prestar uma homenagem involuntária à frota nacional de carros teimosos — aqueles que não morrem nunca, mas derramam óleo na pista como quem deixa migalhas para ser encontrado. A PEC 72/23, aprovada em dois turnos nesta terça-feira (2), isenta do IPVA todos os veículos terrestres com 20 anos ou mais. A proposta agora segue para promulgação.
A votação foi quase unânime: 412 votos a favor no primeiro turno e 397 no segundo. Contra, apenas uns poucos e corajosos três ou quatro deputados que talvez tenham carros novos demais para entender o drama.
A isenção vale para carros de passeio, caminhonetes e veículos mistos. Ficam de fora ônibus, micro-ônibus, reboques e semirreboques — afinal, privilégio tem limite, e sucata pesada ainda faz estrago caro. Segundo o relator, Euclydes Pettersen (Republicanos-MG), a medida “harmoniza a legislação nacional” com estados que já não cobram o IPVA dos veteranos. Uniformiza, sim, mas principalmente oficializa aquilo que muitos motoristas já comemoravam de forma silenciosa: o alívio no bolso por manter um carro com idade para fazer faculdade.
A decisão impacta especialmente estados como Minas Gerais, Pernambuco, Tocantins, Alagoas e Santa Catarina — onde o IPVA continuava firme e forte como se todos os veículos tivessem cheiro de carro novo. Já o Paraná, sempre adiantado quando o assunto é preservar relíquias automotivas, continua isentando com tranquilidade: por aqui, carro com 20 anos já vive aposentadoria plena.
A reforma tributária e o novo mapa das imunidades
A mudança só foi possível porque a reforma tributária de 2023 (EC 132) abriu espaço para imunidades de IPVA. Ao mesmo tempo em que tributou aeronaves particulares e embarcações de lazer, a Constituição passou a isentar tratores, plataformas petrolíferas e aeronaves agrícolas. Agora, soma-se à lista o Fusca 1983 que dorme na garagem e que, com carinho, você chama de “meu clássico”.
O debate: entre a poesia e a fumaça preta
No plenário, deputados repetiram um argumento conhecido: quem tem carro velho não o mantém por charme vintage; mantém porque é o que dá pra ter. Domingos Sávio (PL-MG) celebrou o benefício aos mais humildes. Hildo Rocha (MDB-MA) lembrou que estados como o Maranhão já isentam caminhonetes D20 e C10 — verdadeiras sobreviventes do campo brasileiro.
O relator, Pettersen, resumiu a tese: “Estamos retirando esse tributo para quem já pagou outro carro ao longo de 20 anos de IPVA.” Matemática discutível, paixão automobilística inquestionável.
Enquanto isso, na vida real…
O trânsito brasileiro seguirá sendo um laboratório de resistência mecânica. Carros que vibram como batedeira, escapamentos que caem sem aviso e poças de óleo espalhadas como armadilhas urbanas continuarão compondo a paisagem — agora, porém, isentas. E se a lógica é premiar sobreviventes, então celebremos: cada motor que ainda liga é uma vitória estatística contra as probabilidades.
Afinal, como dizem os mecânicos mais otimistas, “carro velho não quebra; ele avisa”. Só não avisa quando é.
Com informações da Agência Câmara de Notícias; Emenda Constitucional 132/2023; Constituição Federal.
Foto do Arquivo/Agênca Brasil
