O impasse da política brasileira: entre impunidade e descrédito
Decisões judiciais, anistias e anulações revelam um ciclo de desconfiança em que nenhum governo encontra terreno sólido. Leia o artigo de Rogério Bonato
Um leitor perguntou como alguém consegue se despir da “carcaça de jornalista” após tantos anos de profissão. A resposta é simples: quem exerce o ofício com independência, ética e prudência não precisa de disfarces. Pode expor análises sem o formalismo da notícia, livre para interpretar o cenário. Não é como Bruce Wayne, Clark Kent ou Peter Parker tirando a máscara. É apenas a tentativa de compreender as turbas e perceber que o Brasil é lento nas viradas de página, preso ao que chamo de “Clube Med”: onde quem não é medíocre é apenas mediano — ou medonho, sobretudo na política.
Ontem ouvi Sérgio Moro resumindo a trajetória de Lula. Para ele, a anulação de processos representou a volta da impunidade. Citou decisões do STF, a “suspeição” e o que classificou como uma “história da carochinha” que ao final, desmontou operações como Lava Jato, Zelotes e Greenfield. Moro sustenta que o país vive uma mentira desde 2021, abrindo espaço para a corrupção e para o rombo em áreas como a Previdência.
Mas, escrevendo com isenção, penso que o mesmo raciocínio caberia a Jair Bolsonaro: provas, evidências e maioria no STF pesam contra ele. Ainda que o voto de Luiz Fux abra discussões, há vários outros processos em curso. O problema é que o coliseu de opiniões truncadas acabou renovando a política de modo torpe, alçando juízes, generais e ativistas à arena do poder. No fim, sobra a narrativa de que tudo é culpa do Judiciário. Será? Ou não seria a incapacidade de analisar o tecido político com calma, dando espaço a lideranças mais preparadas?
A democracia permite esses ciclos que afetam mais do que saneiam. O desafio é simples de enunciar e difícil de cumprir: melhorar o ambiente político para evitar que qualquer governo — de direita, centro ou esquerda — seja devorado pela insatisfação crônica. As pesquisas não mentem: os índices negativos superam os positivos, seja contra Lula, seja contra Bolsonaro. Falta solo firme. E, sem ele, seguimos à beira da anarquia institucional.
Rogério Bonato escreve para o Almanaque Futuro