Entre correntes e contrabandos: o peso das ordens globais e do trânsito local
De Lula aparentemente fortalecido pelo tarifaço de Trump, segundo as pesquisas, às ruas, avenidas e estradas de Foz, uma quinta-feira que mistura geopolítica, liberdade vigiada e o dia a dia da fronteira.
Bom dia!
Chegamos ao 21 de agosto, data que carrega histórias e curiosidades. No calendário religioso, é dia de São Pio X, o papa reformista que aproximou os fiéis da comunhão diária. No Brasil, marca também o Dia Nacional da Habitação, lembrando a luta por moradia digna. Já no campo da memória, em 1968, a Primavera de Praga foi esmagada pelos tanques soviéticos, e em 1991, o golpe contra Mikhail Gorbachev acelerava o fim da União Soviética. É, portanto, uma data que fala de mudanças, rupturas e da eterna busca por novos caminhos. Que esta quinta-feira seja fértil em bons encontros e boas ideias!
Aprovação em movimento
Lula continua mais desaprovado (51%) do que aprovado (46%), mas a distância, que já foi um abismo de 17 pontos em maio, encolheu para meros cinco. O velho truque da economia ajudou: a comida baixou de preço, e nada é mais poderoso para um governante do que o feijão custar menos no mercado. Some-se a isso o teatro do tarifaço de Trump, e o presidente brasileiro ganhou musculatura política em setores que estavam se esfarelando: baixa renda, idosos, católicos e nordestinos. Até em São Paulo, onde o antipetismo é quase uma religião, a aprovação subiu. Não é exatamente um mar de rosas, mas para quem estava encostado na lona, é quase um renascimento.
Trump, o aliado às avessas
Eis a ironia da história: Donald Trump, ao erguer tarifas de 50% contra produtos brasileiros, conseguiu dar a Lula o que Bolsonaro não entrega há muito tempo — narrativa. Para 64% dos brasileiros, a conta vai estourar no prato; 77% dizem que suas vidas serão prejudicadas. Mas, curiosamente, quem saiu chamuscado foi o bolsonarismo: 55% acham que Bolsonaro e Eduardo lidaram mal com o caso. Lula, ao contrário, encarnou o estadista que enfrenta o gigante do Norte e aparece para quase metade como quem está “fazendo o que é certo”. Ou seja, Trump acertou um tiro que atravessou Bolsonaro e acabou polindo a imagem do atual presidente. Ajudou mais o “inimigo” do que o amigo.
Eis algo para pensar
A escravidão não começou em 1500 nem terminou em 1888. Moisés “abriu” o Mar Vermelho contra faraós, Espártaco enfrentou Roma, Zumbi dos Palmares virou lenda e, antes deles, os sumérios já conheciam a prática de acorrentar o próximo. A regra da humanidade sempre foi simples: os fortes apertam o grilhão, os fracos o carregam. Troque grilhões por bancos centrais, ou chicotes por sanções econômicas, e verá que a liberdade continua sendo uma ideia bonita — mas só no discurso.
Os blocos da discórdia
O BRICS é a versão moderna da rebelião de escravos. Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul resolveram criar um “quilombo” econômico, prometendo cooperação, combate à pobreza e inclusão social. Lindo no papel. Mas basta esse ajuntamento começar a falar em comércio sem dólar para o outro lado do mundo tremer. O império nunca gostou de ver escravo ganhando autonomia. Parece capítulo de Star Wars: quando os jedis se organizam, o império responde com sabre de luz.
O dono da corrente
A tentativa de escapar do dólar não é afronta menor que uma senzala se insurgindo contra o senhorio. Os Estados Unidos se ofendem rápido, e Donald Trump, mais rápido ainda. Ele se comporta como o feitor que perdeu o chicote: rosna, ameaça tarifaço e posa de xerife global. O detalhe é que não manda mais sozinho, nem dentro de casa, nem fora dela. A tal “nova ordem mundial” pode ser confusa, mas já deixou claro que a liberdade internacional continua vigiada de perto pelo velho dono da corrente.
Liberdade sob vigilância
Nos jornais norte-americanos, o debate ferve: de um lado, o bordão “America First” como se o planeta fosse uma fazenda de Trump; do outro, vozes que lembram a gênese da nação — 13 Colônias construídas por imigrantes, guerras civis e depressões que moldaram o século XX. Hoje, a pauta é mediar conflitos alheios: russos contra ucranianos, palestinos contra israelenses. Para muitos americanos, essa diplomacia não passa de uma encenação: a paz como fachada para manter os dedos no tabuleiro. Tarifaço? Nesse contexto, é só mais um espirro imperial.
A bagunça global
Quando oposicionistas nos EUA — democratas e republicanos — sussurram “um dia nos livraremos de Trump”, não falam só de um personagem, mas de um modelo de poder que se arrasta como sombra. A tal “nova ordem mundial” virou um circo desorganizado: blocos econômicos ensaiando independência, potências velhas reagindo como senhores de engenho contrariados, e líderes populistas transformando comércio em guerra cultural. O resultado é um planeta em permanente tensão, onde “liberdade” é um slogan que se vende em dólar.
Bagunça e cortina de fumaça
Francamente, enquanto troca chaminés de lugar, a humanidade deveria olhar para o que realmente importa: o planeta derretendo sob nossos pés. A camada de ozônio amplia, as calotas polares se desfazem, rios viram esgoto, animais sufocam na terra, na água e no ar. Países pobres agonizam e a extinção deixou de ser ameaça distante para virar vizinha. Pergunta rebelde: vamos primeiro organizar a “nova ordem mundial” para depois pensar em salvar a Terra? Barbaridade. A hecatombe nuclear parece mais provável do que o simples ato de preservar o habitat. Não quero posar de Greta Thunberg, a Wandinha das causas ambientais, mas convenhamos: o mundo nunca deu tão pouca bola para a própria sobrevivência. Vamos trocar de assunto porque já senti azia estomacal. Um Sonrisal, por favor!
Bilhões na fronteira
A Receita Federal já destinou, só neste ano em Foz, mais de R$ 238,7 milhões em mercadorias apreendidas. O volume é impressionante: de eletrônicos a pneus, de carros a perfumes, de brinquedos a bugigangas ilegais. Tudo fruto do velho contrabando que atravessa a Ponte da Amizade como se fosse avenida. Houve queda em relação a 2024 — 21,67% a menos — porque a apreensão de cigarros, principal item de destruição, despencou quase pela metade. Em compensação, aumentaram os leilões (33,97%) e as doações para entidades beneficentes (alta de incríveis 1.565%). A conta mostra uma fronteira sempre pulsante: menos fumaça de cigarro, mais lotes nos pregões e mais bazares beneficentes recheados de quinquilharias.
Entre o bazar e a prateleira
A destinação divide opiniões. Para uns, é política pública de aproveitamento: o que seria lixo vira sabão, álcool em gel, ecobags e até travesseiros, graças às universidades da região. Para outros, é concorrência desleal: comerciantes reclamam que bazares de entidades filantrópicas, abastecidos pela Receita, competem com liquidações e promoções do comércio local. Este colunista vê mérito na transformação do ilegal em utilidade social, mas entende o desconforto. No fundo, é mais uma prova de que em Foz até contrabando precisa de política pública — e de que a fronteira nunca descansa, nem quando finge estar ajudando.
Carta à redação
Prezado colunista, você já transitou pelas ruas Argemiro Lemos/Itaboraí (ligação com o viaduto de Três Lagoas e Rodovia das Cataratas)? Se não, convido-o a fazê-lo. Mas vá preparado, arrume um veículo “off-road” senão você não passa. São depressões e crateras enormes que engolem veículos de menor porte. O prefeito anunciou num programa na Rádio Cultura, já faz algum tempo, que já tinha dinheiro para fazer uma avenida moderna nessa área. Perguntas que não querem calar: porque não começa logo? Cadê o projeto? Cadê a licitação? É para todo o trajeto ou só para o trecho da Rua Itaboraí? Enquadre o prefeito, senhor colunista. E.B. O leitor pediu que apenas as iniciais de seu nome fossem publicadas.
Pelas ruas, estradas e avenidas
Este colunista andou circulando pelas principais vias da cidade e mostrando no Instagram como elas estão — e a enxurrada de respostas confirma: a situação é de chorar. Um “off-road” já não basta, seria preciso um jipe lunar para vencer os buracos. O carro deste escriba, coitado, foi parar na oficina e lá permanece, vítima da suspensão massacrada. Ruas como a Itaboraí e a Avenida Maria Bubiak são praticamente intransitáveis, avisamos há tempos. Parece que a aposta é deixar tudo nas mãos da futura Perimetral Leste, mas ela foi pensada para veículos pesados e não para o cotidiano dos moradores. A prefeitura precisa encarar o problema das demais vias antes que a frota local seja toda transferida para o ferro-velho.
Lentidão e sufoco
Na terça-feira, o trânsito travou de forma épica: quase quatro quilômetros de engarrafamento entre o Golf Clube e a rotatória da Avenida Safira, em frente ao Shopping. O motivo? Uma carreta que quebrou bem no meio da Avenida das Cataratas. Quando finalmente retiraram o trambolho, veio a surpresa: outra carreta quebrou no mesmo ponto e ficou lá até as 19h. Talvez a transportadora ou o dono do caminhão não apreciem o apelido de ‘trambolho’, mas diante da cena frequente no transporte transfronteiriço, a palavra parece ser adequada.
Ronco que incomoda
Enquanto a AIFU fecha bares e aplica multas por falta de alvará, quando o Foztrans vai se mexer para coibir o barulho ensurdecedor dos escapamentos adulterados? O problema é tão grave que já virou “modalidade esportiva”: há estabelecimentos no próprio eixo turístico que promovem disputas de “ronco de motores”, como se a vizinhança fosse obrigada a aplaudir a cada estalo metálico. É a desgraça coletiva travestida de diversão mecânica. Foz precisa de blitzes para aferir ruídos, multar quem desrespeita e devolver o mínimo de paz à cidade. Porque sossego também é qualidade de vida.
Até amanhã
E assim fechamos a quinta-feira, com reflexões sobre liberdade e escravidão modernas, as trapalhadas de Trump, as mercadorias apreendidas na fronteira, as condições das nossas ruas e até o ronco insuportável dos escapamentos que desafiam o sossego público. Uma mistura de temas que mostram como o mundo e a cidade respiram entre tensões globais e problemas muito locais. Desejo a todos uma ótima quinta-feira, e já adianto: amanhã a coluna volta com ainda mais assuntos quentes e abordagens interessantes. Até lá!

Rogério Bonato escreve regularmente ao Almanaque Futuro
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