Quando o trânsito emperra, as tarifas dividem e o turismo explode: retrato das encruzilhadas de Foz do Iguaçu
Reflexões sobre obras, políticas públicas, mercado de trabalho e o eterno jogo entre progresso e impasses. Leia isso tudo na coluna de Rogério Bonato.
Calma, que o asfalto vem aí
Antes de abrir a coluna, uma nota aos motoristas e usuários da área Sul de Foz, onde se concentram as grandes obras estruturantes: organizem-se, saiam mais cedo e, se possível, tomem um chá de folha de maracujá, porque a situação é de testar a paciência até de monge tibetano. As filas nos dois sentidos são longas, irritantes e, para piorar, muita gente é pega de surpresa pelas mudanças repentinas das empreiteiras. Não adianta buzinaço, gritar pela janela ou xingar o operador do trator. Antes reclamavam que as obras andavam a passo de tartaruga; agora que aceleraram, reclamam do mesmo jeito. E, para completar, não há rota alternativa. A novidade é que já asfaltam as alças do viaduto na Avenida das Cataratas e correm para concluir os acessos da BR-469. Melhor respirar fundo — porque o asfalto chega, mas não com teletransporte.
Adequação da taxa do lixo
Prezado colunista, as tarifas sociais são justas: permitem que as pessoas utilizem os serviços públicos pagando valores que cabem em seus bolsos. Já as isenções são outra história — nós, contribuintes, as sustentamos por meio de um rateio, cobrindo aqueles que estão isentos de luz, água e outros serviços. É assim que funciona a coletividade. É parecido com o que acontece quando alguém rouba fios de energia: o prejuízo acaba sendo repassado aos consumidores, que ainda sofrem com os apagões. Quero dizer que foi muito pertinente sua análise ao apontar que alguém pode morar numa casa ampla, com terreno grande, cuidar corretamente dos resíduos e, ainda assim, pagar o mesmo que o vizinho de um imóvel muito menor que não tem o mesmo zelo. Aí entram, inevitavelmente, questões financeiras, culturais e, no fim das contas, políticas. O senhor é um homem esclarecido, formador de opinião; já o vizinho pode não ser — e é sobre esse tipo de pessoa que a política costuma se aproveitar. Por fim, lembro que em sua análise não foi mencionada a cobrança do IPTU, que não é nada barata considerando os valores venais. Isso, por si só, deveria absorver parte do compromisso do cidadão com o meio ambiente.
Siga no debate, jornalista, Paulo Roberto da Costa
A subjetividade do ser
Mencionaste em sua coluna os “carrões” que deixam crianças nas creches públicas. O que me pareceu faltar foi analisar se, ao ocuparem essas vagas, crianças de famílias que poderiam recorrer à rede particular não estariam tirando o lugar de outras que realmente precisam. Quando ouço várias pessoas reclamarem disso, concluo que o problema não é o modelo do carro, mas sim o sistema e o critério de preenchimento das vagas. Será que basta madrugar na fila para conseguir uma? Ou há assistentes sociais indo até as casas para avaliar a real necessidade? Creches têm um papel fundamental: educam e ajudam pais que precisam trabalhar. Seu texto não está errado — levo minha filha à creche e vejo essa situação todos os dias. Sei quem é motorista de aplicativo, quem usa carro da empresa ou atua no turismo e, por isso, precisa de um veículo melhor. Mas também sei quem poderia tranquilamente pagar por uma escola particular e se aproveita de amizades ou influências para garantir a vaga na rede pública. Tomara que a prefeitura normatize isso, aplicando critérios mais justos e socialmente responsáveis.
E.L.V.B. (A leitora pediu que seu nome não fosse publicado)
O debate segue
As cartas publicadas hoje mostram exatamente o propósito desta coluna: provocar reflexão e estimular o diálogo sobre temas que atravessam nosso dia a dia. Ao abordar a taxa do lixo ou a ocupação de vagas em creches públicas, abrimos espaço para que diferentes visões se manifestem — e isso é saudável. No curso da semana, traremos respostas mais pontuais para os casos citados, ouvindo as partes envolvidas e buscando dados que ajudem a esclarecer cada situação. Afinal, é para isso que escrevemos: analisar a sociedade, expor suas contradições e, quem sabe, inspirar soluções.
70 mil é número grande, mas…
O estoque de empregos formais em Foz do Iguaçu está em 70.066, número robusto e digno de registro. Mas é preciso lembrar que “estoque” não significa estabilidade. Oscilações mensais com contratações e demissões mostram que manter esse patamar exige esforço constante — e não apenas anúncios otimistas. O dado mais relevante é que, no primeiro semestre, houve saldo positivo de 1.677 vagas, ainda que menor que no mesmo período de 2024. No mundo real, o desafio continua: gerar oportunidades, qualificar gente e segurar a mão de obra que, muitas vezes, cruza a ponte em busca de ganhos mais altos na informalidade.
Empreender não é para amadores
Vamos repetir: enquanto o saldo de empregos desacelera, a abertura de empresas em Foz vai no sentido oposto: 5.941 novos CNPJs no primeiro semestre, contra 3.210 fechamentos — saldo de 2.731 empreendimentos. É um indicador de que o mercado enxerga potencial na cidade, mas também um lembrete: abrir portas é só o começo. A sobrevivência no ambiente empresarial exige mais que entusiasmo; pede planejamento, inovação e adaptação às oscilações econômicas. É aí que muitos ficam pelo caminho — e voltam para a estatística do desemprego. Outra coisa: CNPJ laranja não deveria contar.
Entre vagas e candidatos
A Agência do Trabalhador segue promovendo mutirões e capacitações para aproximar vagas e candidatos. Mas, na prática, ainda há postos que ficam sem preencher pela falta de qualificação ou experiência. Cursos no Senai e Senac ajudam, mas exigem disciplina de quem quer se recolocar. Do lado das empresas, a reclamação é recorrente: encontrar mão de obra que una técnica e compromisso não é tarefa simples. No fim, é como no velho ditado: não basta ter a vaga, é preciso ter quem a ocupe — e fique nela. A rotatividade nos postos de trabalho é grande. Todo mundo quer a carteira assinada, mas é preciso fazer valer o registro.
Bombeiros: quase meio século de bravura
Não poderia deixar passar em branco a marca histórica dos 49 anos do 9º Batalhão de Bombeiros Militares em Foz do Iguaçu, celebrada no último dia 12, na Vila A. São quase cinco décadas de dedicação ininterrupta, com valorosos policiais militares que, ao longo da permanência na fronteira, salvaram incontáveis vidas em situações das mais diversas. Bombeiro está sempre no topo da confiança popular — e nada abala a credibilidade de um profissional assim. Ainda é lamentável que existam pessoas que gastem tempo aplicando trotes, um crime que prejudica o atendimento a quem realmente precisa. Aqui, não há fronteiras para os nossos bombeiros: socorrem sinistros, catástrofes e acidentes até no Paraguai e na Argentina, sempre prontos para o que vier. A solenidade deste ano homenageou veteranos, reconheceu méritos com medalhas e reafirmou a cooperação da Tríplice Fronteira. E que venha o cinquentenário, porque coragem e compromisso eles têm de sobra.
PRF: voando alto pelo bem
Há quem ainda acredite que os helicópteros da PRF servem apenas para perseguir contrabandistas em fuga cinematográfica. Nada disso. Na prática, o barulho das hélices significa, na maioria das vezes, socorro chegando. E rápido! Neste mês, a Polícia Rodoviária Federal celebrou dois anos da retomada do serviço aeromédico no Paraná, que desde agosto de 2023 já realizou 484 resgates e remoções — salvando vidas nas rodovias e muito além delas. Baseado em Curitiba, o serviço opera em parceria com a Força Aérea Brasileira e outros órgãos, transportando pacientes, órgãos, medicamentos, alimentos e até sementes para comunidades indígenas. Também já ajudou no combate a incêndios e em missões humanitárias no Pantanal e no Rio Grande do Sul. Tudo isso com um tempo médio de resposta invejável: 18 minutos. Investimento de R$ 30 milhões? Sim. Mas, como dizem por aí, quando é para salvar vidas, cada minuto vale ouro — e cada voo é mais importante que qualquer manchete sobre apreensão. E convenhamos: helicóptero que carrega esperança voa mais leve.
Poor Niagara, outra vez
Mais de dois milhões de visitantes já estiveram nas Cataratas do Iguaçu em 2025, somando ingressos dos lados brasileiro e argentino. São passeios diferentes, e há muita gente que se dá ao luxo de fazer os dois — e sai dizendo que “vale cada gota”. É bom lembrar que houve um tempo em que se soltava rojão quando a contagem passava de 500 mil turistas. Hoje, a expectativa é de novo recorde pelo lado brasileiro, superando a marca histórica de 2019. E aqui vai a comparação inevitável: Niagara Falls, lá na fronteira entre EUA e Canadá, recebe de 12 a 14 milhões de turistas por ano. Mas, como disse Eleanor Roosevelt quando viu as nossas quedas: “Poor Niagara”. E nós, cá do lado tropical, concordamos sem medo de parecer convencidos.
O efeito cascata no turismo
O sucesso das Cataratas em 2025 não se limita ao espetáculo das águas. A alta visitação impulsiona a rede hoteleira de ambos os lados da fronteira. Em julho, Foz do Iguaçu bateu média de 76% de ocupação, chegando a 82% na segunda quinzena. Do outro lado, Puerto Iguazú oferece de tudo: hotéis luxuosos, pousadas charmosas, hostals cheios de mochileiros e uma vida noturna que compete com o rugido das quedas. No fim, o que se vê é um literal efeito cascata: quanto mais turistas, mais empregos, mais renda e mais histórias para contar.
A melancia no pescoço
Dá uma satisfação enorme escrever sobre o trabalho dos vereadores quando isso vale a pena — sem fisiologismo nem encrenca gratuita. Mas há quem fique enciumado quando faço elogios a um ou a outro. Dia desses, um vereador ligou perguntando por que não publico nada sobre o seu trabalho. Respondi: “Se eu souber o que está fazendo, fica mais fácil, meu amigo”. E ele retrucou: “Mas é só você pegar essas notícias nos grupos de imprensa!”. Ora, e eu tenho tempo para ficar passeando em redes sociais? Talvez seja hora de rever o conceito de assessoria. Político que quer aparecer precisa estar bem conectado com formadores de opinião e, no mínimo, enviar releases sobre o que anda fazendo. Foi-se o tempo do jornalismo guiado por bola de cristal — e, convenhamos, melancia no pescoço não é assessoria, é só folclore.
É tudo muito simples…
Todo bom assessor que se preza tem uma listinha de jornalistas que considera influentes. Não custa nada enviar informações sobre o que seu chefe anda fazendo. As que chegam a este colunista, em geral, são publicadas — sempre com a devida contextualização, porque o debate pressupõe ouvir todos os lados. Nesse quesito, o vereador Bosco Foz tem se destacado: encaminha tudo o que faz, independentemente do troco crítico que possa vir depois. Trabalha muito, já deve ter batido o recorde de projetos, o que, naturalmente, incomoda alguns pares. É o efeito colateral de quem se mexe.
Bosco mira a saúde infantil
Na primeira sessão pós-recesso da Câmara, Bosco Foz apresentou um pacote de oito projetos para fortalecer a pediatria na rede pública. As propostas vão de brinquedotecas hospitalares (com direito a programa “Adote uma Brinquedoteca” para empresas) até a criação de um Banco Municipal de Equipamentos Pediátricos de Urgência, passando por capacitação contínua e protocolos padronizados para o atendimento infantil. O parlamentar garante que as ideias nasceram de fiscalizações em UPAs e UBSs. E, pelo visto, não quer parar: reforçou que a saúde das crianças seguirá como prioridade. Que os projetos avancem e que a cidade colha os resultados — afinal, criança não vota, mas a sociedade inteira sente quando elas não recebem o cuidado devido.
Lei ou redundância?
A Câmara de Foz aprovou um projeto que proíbe apologia ao crime, uso de drogas e conteúdo sexualmente explícito em eventos financiados com recursos públicos. A regra vale para atividades abertas ao público infantojuvenil e prevê multas, rescisão de contrato e até cinco anos de impedimento para novos acordos com a prefeitura. Pergunto: é mesmo necessário criar uma lei municipal para algo que já está escrito na Constituição e previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente? Se a norma vale para o Brasil inteiro, por que não vigoraria em Foz? Talvez o problema não seja a falta de lei, mas a falta de cumprimento e de comportamento ético.
Moral por contrato
O texto aprovado obriga que todo contrato público para eventos juvenis tenha cláusula proibindo apologia ao crime e outros conteúdos nocivos. A pena pode chegar a metade do valor do contrato em multa, fora as sanções já previstas na legislação federal. No papel, parece uma proteção extra; na prática, soa como um reforço do óbvio. Mais do que novas normas, o que se espera é fiscalização efetiva e responsabilidade de quem contrata — porque moralidade não deveria depender de cláusula contratual, mas de postura.
Marteladas e leis que já existem
Martelando, ou explicando melhor: no Brasil, apologia ao crime já é crime — e não de hoje. Está no artigo 287 do Código Penal: “fazer, publicamente, apologia de fato criminoso ou de autor de crime” rende de três a seis meses de detenção ou multa. Ou seja, não precisa inventar moda para proibir aquilo que a lei federal já enquadra. Mesmo assim, vivemos num país em que, aparentemente, só se cumpre o óbvio quando alguém bate o martelo outra vez, seja em Brasília, seja nas câmaras municipais. A apologia não é o mesmo que incitar um crime. A primeira exalta e legitima atos ilegais ou criminosos; a segunda incentiva que se cometa o crime. Exemplos? Defender publicamente um assassino, engrandecer a imagem de líderes de facções, ou usar músicas, vídeos e textos para enaltecer o tráfico e a violência. A fronteira com a liberdade de expressão é clara: ela não é absoluta, e cessa quando põe em risco a segurança pública ou atenta contra a paz social. O resto é insistir naquilo que já está escrito, como se a sociedade só funcionasse sob nova martelada — por via das dúvidas, reforçada em ata. Barbaridade!
Até terça!
E assim fechamos mais uma semana de coluna, entre debates sobre empregos e empreendedorismo, comparações turísticas que fizeram Niagara minguar, homenagens a quem salva vidas no ar e na terra, e, claro, as sempre animadas discussões sobre leis que tentam reinventar o que já está na Constituição. Teve trânsito travado com dose de chá de maracujá, vereadores produtivos (e outros nem tanto) e reflexões sobre o quanto nossa sociedade só anda sob “marteladas”. Desejo a todos um sábado e domingo cheios de boas conversas, bons encontros e, se possível, boas notícias. Na terça-feira estamos de volta, prontos para mais uma rodada de observações, provocações e histórias que valem ser contadas. Até lá, aproveitem — porque a vida, ao contrário das grandes obras, não pode parar no engarrafamento.
Rogério Bonato escreve regularmente para o Almanaque Futuro e em breve terá aqui, o podcast do texto completo, aos que preferem ouvir.